quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Viver como os lírios do campo


Viver como os lírios do campo

Quero viver como os lírios do campo.
Ele não "trabalham nem fiam",
não têm ambição da glória.
Humildes e serenos são os lírios do campo.

Onde há ambição não haverá paz e harmonia,
ainda que seja a ambição de restabelecer
a paz no mundo.
Pensar que se pode obter paz através da ambição
é uma tolice tão grande quanto pescar no mato.

Já tive a grande ambição de tornar-me
um pregador da salvação do mundo.
Para tal, eu precisaria ter o meu nome
amplamente divulgado.
E isso envolve uma série de autopromoção, táticas,
expedientes e estratagemas.

Pesaroso, noto que até mesmo um certo pregador
que exalta a "vida de contrição",
a quem estimo e respeito,
parece esta sendo contaminado pela ambição.

Apesar de pregar a "vida de contrição"
e a "vida norteada pela humildade",
os textos de seu editorial, na primeira página
da revista por ele publicada,
são meras palavras de autopromoção

Aquele que é verdadeiramente humilde
vive o Caminho sem fazer alardes.
Os lírios do campo não pregam o Caminho
com atitudes altaneiras.
Eles vivem o Caminho, simplesmente.

O Caminho está ao alcance de todos.
Os lírios do campo vivem tranquilos
no lugar a eles concedido,
absorvem os nutrientes a eles oferecidos,
são belas flores no tom e no formato permitidos
e fenecem silenciosamente quando chega sua hora.

Os lírios do campo
não pensam em fugir do seu lugar,
nem em absorver outros nutrientes
além daqueles que lhe são destinados.
Fazem desabrochar suas flores,
na cor e no formato peculiares
e não pensam em fugir dos desígnios de Deus.
Isso é viver o Caminho.
Os lírios do campo vivem o caminho.

Os lírios do campo não têm a pretensão de salvar o mundo.
Eles simplesmente vivem o Caminho.
Se alguém lhes perguntar o Caminho,
eles nada dirão,
pois a resposta está no seu próprio viver.
Confesso, envergonhado,
que já tive a ambição
de tornar-me rico e poderoso
e promover grandes obras assistenciais
para salvar os pobres do mundo inteiro.

Para isso, queria ter muito dinheiro.
Passava noites em claro,
pensando num meio de obter dinheiro,
imaginando a vida miserável dos pobres
e a vida luxuosa dos ricos.

A comiseração para com os pobres
e a rejeição contra os ricos -
Que entendam a primeira como amor
e a segunda como ódio,
mas ambas são humanas paixões;
e neste sentido eram igualmente grilhões que me aprisionavam.

Onde há humanas paixões, não há paz.
Como pode alguém estabelecer a paz no mundo,
se não consegue alcançar sua própria paz?

- Eis por que muitas das revoluções sociais
não conseguiram alcançar seus objetivos.

Mas vejo, agora, o verdadeiro caminho da paz.
Os lírios do campo não pretendem angariar fundos
em prol do movimento de salvação do pobres.
Experimente apelar a eles:
"Irmãos, estou faminto; salvem-me!"
Certamente eles se limitarão a lhe oferecer
seus próprios bulbos, dizendo:
"Irmão, queira aceitar isto. É tudo o que tenho".

Eis o verdadeiro Caminho.
Eis a verdadeira paz.
Os lírios do campo não pregam o Caminho
nem têm a pretensão de distribuir dinheiro
para os pobres.
Eles se contentam em viver no lugar que lhes
foi destinado,
absorvendo os nutrientes que lhe são oferecidos.
Vivem segundo os desígnios de Deus,
sem recorrer a mentiras, estratégias e artimanhas.
Não pregam nem Mahayana nem Hinayanas.
Não têm a pretensão de fomentar a reforma social,
nem de tornar-se um pregador da salvação do mundo,
e vivem uma simples vida comum.
Seu próprio viver já é uma grande pregação.

Este é o verdadeiro Caminho.
É o Caminho a ser trilhado pelas pessoas
simples e comuns.
É o Caminho que qualquer um pode seguir
agora mesmo, bastando a ele querer.
O Caminho deve ser acessível a todos.
O viver singelo dos lírios do campo -
nele está o caminho a ser trilhado por nós.
Quero trilhar esse Caminho, a partir de agora.
Quero trilhar esse Caminho, a partir de agora.

Porém, eis que minha esposa me indaga:
"Mas não achas que, no palco deste mundo,
são necessários diversos tipos de personagens?
Se todos se tornarem lírios do campo,
que será deste mundo?
Não é verdade que o progresso do mundo
foi promovido por pessoas que não se
contentavam em ser lírios do campo?".

E eu respondo:
"Falas em progresso?
Pois estás iludida...
Quanto o mundo progrediu com ambições humanas?"

"Imponentes arranha-céus,
isso é progresso?
Belas roupas da moda,
isso é progresso?
Grande número de cientistas,
isso é progresso?
Admitindo-se que tudo isso seja progresso,
até que ponto os sofrimentos humanos diminuíram
desde o nascimento de Buda há três milênios?
"Quanto maior o progresso material,
mais aumentam as aflições do ser humano.
Já pensaste no porquê disso?
Digo-te, pois: é porque o progresso de que falas
baseia-se nas ambições humanas.
É preciso abandonar as ambições.
Só assim se alcança o verdadeiro progresso -
o progresso da alma -, em vez do progresso aparente.

"Disse que quero viver como os lírios do campo,
mas não disse que todos devem ser como os lírios
do campo.
O que quis dizer é que cada um seja autêntico,
seja como ele é.
É assim que se alcançam a paz e a tranquilidade."

Os lírios do campo não têm a pretensão de fazer
desabrochar rosas em seus ramos;
Eles produzem flores que lhes cabe produzir.
Não distorcem a Natureza.
Os lírios do campo não têm a pretensão de transformar
Seus bulbos em batatas;
Eles simplesmente produzem bulbos que lhes cabe produzir.
Não distorcem a natureza.

Falei dos lírios do campo.
Mas tudo o que disse aplica-se também a outras plantas e outros seres.
É natural que na roseira desabrochem rosas.
Quando a roseira vive plenamente sua própria vida,
assim como os lírios do campo vivem sua vida,
em seus ramos desabrocham naturalmente belas rosas.

Militantes da revolução social
e pregadores da salvação da humanidade,
se vocês são simples e sem ambição,
como os lírios ou as roseiras que florescem naturalmente,
e conseguem realizar com êxito a revolução ou a obra de salvação
Com naturalidade e humildade,
então vocês estarão vivendo a vida de que falei:
A vida simples, pura e autêntica,
Como a dos lírios do campo.
Masaharu Taniguchi, Seimei no Jisso volume 20

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